‘2022 será um ano desafiador, com baixo crescimento e inflação elevada’, avalia economista

15 de fevereiro de 2022 - 11:44 # # # #

O ano de 2022 deverá ser marcado por baixo crescimento e inflação elevada. A avaliação é da professora do mestrado profissional em Economia da Escola Brasileira de Economia e Finanças (EPGE) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Sílvia Matos, que participou, na última sexta-feira (11), como palestrante convidada do webinar “Cenários macroeconômicos para 2022 – Inflação e o impacto nos estados da política de preços dos combustíveis”, realizado Observatório do Federalismo Brasileiro (OFB), vinculado à Secretaria do Planejamento e Gestão do Ceará (Seplag-CE). Conforme a economista, parte desse cenário desafiador deve-se à “herança” deixada pelo ano de 2021, onde, além de inflação elevada e desaceleração da economia, o País também teve um mercado de trabalho muito fragilizado. Aliado aos fatores internos, está o cenário internacional, com desaceleração do crescimento, aumento da taxa de juros e pressão inflacionária.

“Esperamos uma desaceleração da inflação, mas ainda deve permanecer acima do limite superior da meta de inflação, em 5,6%. Para o crescimento, a expectativa é de 0,6%. Esse cenário desafiador deve-se a diferentes fatores. A pandemia de covid-19 exacerbou problemas sociais que já existiam. Parte desse cenário mais negativo decorre de um ambiente político que age no sentido de aumentar as incertezas fiscais. Uma dificuldade de entender os choques que ocorreram, de lidar contra a pandemia, dos desafios impostos pela pandemia e de pensar em políticas adequadas do ponto de vista social. A fragilidade do cenário político e, ao mesmo tempo, um período de eleição, exacerbou uma questão fiscal”, disse Sílvia Matos, acrescentando que é necessário gastar com políticas sociais, mas que é preciso saber de onde virão esses recursos.

A economista afirmou que a desaceleração econômica com inflação “é um choque muito atípico”, mas é um problema global e é preciso verificar como lidar com isso no Brasil. “No debate de inflação, a gente tem que entender os determinantes da inflação no momento atual. Isso faz com que tenha uma necessidade de uma subida de juros em um momento de um mercado de trabalho ainda enfraquecido. Isso já ocorria antes da pandemia, mas a crise sanitária exacerbou o problema social. Importante destacar que parte desse cenário negativo decorre sim de um ambiente político que age no sentido de aumentar as incertezas fiscais”, acrescentou.

Exemplo cearense

Para a economista, políticas públicas eficazes e eficientes são fundamentais para amenizar os impactos negativos do atual cenário macroeconômico e acelerar o crescimento da economia. Nesse sentido, ela parabenizou o Estado do Ceará que, em sua avaliação, “vem cumprindo esse papel e se destacando, há vários anos, pela adoção de políticas públicas de Estado, não de governo”.

De acordo com ela, é fundamental alinhar os interesses políticos com os interesses da sociedade para garantir a implementação e continuidade de políticas públicas capazes de promover o desenvolvimento socioeconômico estadual. “O Estado do Ceará é uma exemplo a ser seguido no debate de educação e investimento público, por exemplo”, finalizou.

Pressão dos combustíveis

O webinar do OFB também focou na questão do preço dos combustíveis, que tem subido de forma acelerada no Brasil. Atualmente, já existem cidades brasileiras onde o litro da gasolina ultrapassa os R$ 8,00. A discussão sobre o assunto, contudo, precisa ser feita com cautela e transparência para elevar o nível do debate e focar nas reais causas da escalada dos preços. O alerta foi feito pela titular da Secretaria da Fazenda do Ceará (Sefaz-CE), Fernanda Pacobahya, que também participou do webinar.

“Houve um movimento bem arquitetado pelo governo federal para desqualificar o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no sentido de trazer os estados para o centro de um problema que eles não deveriam ocupar. O aumento dos combustíveis no Brasil não se deu por conta da carga do ICMS. Esse discurso pegou muito fácil. Foi-se fazendo um aprofundamento dessa questão até que tivéssemos no Congresso Nacional alguns Projetos de Lei (PL) que acabaram tramitando e que são extremamente gravosos. Gravosos em que sentido? O governo federal sabe da importância da tributação dos combustíveis para qualquer Unidade da Federação. Digo qualquer Unidade da Federação, porque isso não afeta só os estados. Cerca de 25% da arrecadação do ICMS vai para os municípios. Então, essa é uma medida que desestrutura qualquer Unidade da Federação. Todas as Unidades da Federação têm por carro-chefe os combustíveis. Afeta as arrecadações municipais. Aí, ao invés de nós termos um federalismo de cooperação, que é o que muito se almeja em qualquer federação do mundo, nós temos um federalismo de competição aguçada”, afirmou a secretária da Fazenda.

Durante a sua exposição, ela citou os PLs 11/2020 e 1472/2021 e destacou que a tributação do ICMS é “vocacionada” a alcançar o consumidor final, no caso, o preço praticado na bomba de combustíveis, e que isso tenta ser “desmoronado”. “O PL 11/2020 tenta trazer coisas como se fossem novidades. Quem conhece a tributação de combustíveis, energia elétrica e de comunicação sabe que não é algo complexo. O Brasil já pratica, pela substituição tributária, uma tributação em uma única fase. Existem normativos celebrados no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) que os estados aderiram em que a tributação se dá no momento da saída da refinaria. E esse momento da saída da refinaria projeta a venda para o consumidor final. Existe uma tributação antecipada nas refinarias, mas ela está sempre refletindo o preço que é praticado nas bombas para cada um de nós. É aí que o governo federal tenta trazer um ar de simplificação quando, na verdade, uma tributação em fase única já existe no Brasil, observou.

A secretária da Fazenda chama atenção para outro ponto do PL 11/2020: a simplificação da tributação a partir da uniformidade das alíquotas no Brasil. Segundo Fernanda Pacobahyba, os defensores do PL 11/2020 afirmam que, dessa forma, nenhum estado ganharia ou perderia em arrecadação, o que, para ela, não é verdade, uma vez que, se fosse atingido um patamar médio de 15% de alíquota, quem hoje possui 12% teria uma arrecadação média maior, enquanto quem possui 18% teria uma arrecadação média menor. Ela destaca ainda que a criação de uma “câmara de compensação”, na qual os estados que hoje têm uma alíquota maior seriam compensados por outros estados para que não houvesse impacto na sua arrecadação, é “absolutamente insustentável”.

“O preço do litro de gasolina acima de R$ 8,00 é inaceitável, mas está ocorrendo por algo muito simples: o preço do petróleo tipo Brent está em alta e a relação dólar/real está extremamente elevada. Atrelado a isso, existem medidas que são irresponsáveis e que acabam gerando um círculo vicioso no sentido de que, quanto mais irresponsável for o governo federal, mais o risco do País aumenta, menos pessoas estarão acreditando nesse País, mais aumenta a inflação, mais aumenta a cotação do dólar comparativa”, avalia.

Alento

Apesar do cenário desafiador, a titular da Sefaz-CE acredita haver um alento: o PL 1472/2021, que objetiva a criação de um fundo de estabilização dos preços dos combustíveis. “Essa é uma prática exitosa que é encontrada em vários países do mundo e que não contaria com recursos que fossem prejudicar ainda mais a situação já delicada dos estados e municípios brasileiros, além de colocar no centro da questão os altíssimos dividendos que a Petrobras tem distribuído para seus acionistas em detrimento da população que está amargando prejuízo com um preço de combustível que é praticamente inaceitável”, disse.

Saiba mais

O webinar foi conduzido pelo secretário executivo do Planejamento e Orçamento da Seplag, Flávio Ataliba, e transmitido pelo canal da Secretaria do YouTube. O vídeo completo do webinar pode ser conferido clicando aqui.